A metacognição, com seus raciocínios de segunda e de terceira ordem, é uma praga. Todo mundo sabe que Fernando Haddad sabe que será muito difícil zerar o déficit fiscal em 2024. E é claro que Haddad sabe que todo mundo sabe que ele sabe da dificuldade. Mas, se é assim, por que não adotar uma abordagem mais honesta e propor uma meta mais factível?

Haddad sabe onde pisa. Sabe que as pressões por gastos vêm de todos os lados, do PT, de Lula, do Congresso, de empresários. Se logo de saída ele admite relaxar os limites, estimula mais pedidos. E não é só. O recém-sancionado arcabouço fiscal traz travas a dispêndios que só são acionadas em caso de descumprimento da meta. Haddad sabe que será mais fácil manter a disciplina com uma meta ambiciosa frustrada do que com uma realista intacta.

O interessante é que, até assumir o ministério, o discurso econômico de Haddad não se diferenciava do de outros petistas, que tendem a rejeitar controles sobre despesas que consideram prioritárias. Mas foi só virar ministro para que se tornasse um pão-duro. Com Palocci foi a mesma coisa. Minha hipótese é que a cadeira faz o homem, isto é, o cargo que um indivíduo ocupa acaba determinando suas posições.

Essa era uma tese pouco questionada até alguns anos atrás. Candidatos costumavam assumir posições radicais em campanha, mas, uma vez que assumissem o posto, abraçavam a moderação. Não é que isso tenha desaparecido. A premiê da Itália, Giorgia Meloni, embora tenha sido eleita por um partido de extrema direita, vem fazendo uma gestão não extremista. É claro que também temos os Trumps, Bolsonaros e Netanyahus que chegam ao poder prometendo arrebentar e arrebentam. Acho que isso tem a ver com as redes sociais, que reforçam a ligação direta entre líderes e seus apoiadores.

Resta esperar que os apuros jurídicos em que essas figuras se meteram dissuadam outros políticos de imitá-los. Viva a metacognição.


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Uol

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